Philippe Fernandes
Paz, harmonia, fraternidade e integração. Com este espírito, mais de 39 mil pessoas, de 100 diferentes países, se reuniram em Hampshire, na Inglaterra, para o “Jalsa Salana UK”. O evento é promovido anualmente pela comunidade muçulmana Ahmadia, uma vertente do islamismo. Petrópolis, cidade onde está localizada a única mesquita da Ahmadia no Brasil, foi representada e se destacou durante o evento, realizado entre os dias 2 e 4 deste mês. O Diário acompanhou a delegação brasileira e traz, nesta página, os principais destaques do evento.
Quando se chega ao evento, a primeira impressão é a do cumprimento do lema da Ahmadia: “amor para todos, ódio para ninguém”. A imagem de uma religião fechada e pouco receptiva às demais correntes de pensamento, que se criou no Ocidente, é desfeita já à primeira vista. Seja no contato com organizadores, voluntários ou mesmo pessoas que só foram ao local por serem seguidores da religião, o que se vê é um clima de total cooperação, amizade e boa receptividade.
Além disso, a estrutura e a organização para um evento deste porte também impressionam. O grande terreno que abrigou o evento em Hampshire teve dois grandes templos, espaços que foram utilizados para as orações diárias e para os pronunciamentos do califa Mirza Masroor - maior autoridade da Ahmadia, equivalente ao Papa na Igreja Católica. Além disso, quem passou por lá viu stands com alimentação, venda de artigos religiosos, além de um minimuseu, onde a história do islã e da Ahmadia foi contada.
O presidente da Comunidade Ahmadia no Brasil, Wasin Zafar, destacou que é uma honra para a associação representar o país no mundo.
- É uma coisa única no mundo, um evento desse tamanho. Considero que o Jalsa Salana UK foi um símbolo de amor para todos. O nosso slogan não é só na teoria. Estamos olhando na prática. Pudemos ver pessoas de todos os cantos do mundo, países ricos e pobres, mas todos com sorriso, em clima de paz, respeitando um ao outro. É isso é o que a Ahmadia divulga e pratica no mundo inteiro - destacou.
Zafar também ressaltou que todo o trabalho é voluntário, e os gastos não tiveram suporte de nenhum governo.
A comitiva petropolitana foi selecionada para um encontro reservado com o califa Mirza Masroor no escritório da Ahmadia Internacional, em Islamabad. Durante a reunião, o líder religioso falou sobre o atual momento vivido pelo Brasil e pela América Latina. O califa destacou que "os líderes precisam seguir o povo e, por outro lado, o povo também deve seguir as regras". Masroor afirmou que o Brasil possui muitas riquezas e muito potencial, e todos devem colocar as suas melhores capacidades para trabalhar em prol do desenvolvimento do país.
Masroor recebeu moção dos poderes Legislativo e Executivo, além de uma placa da Secretaria de Educação, reconhecendo e agradecendo o trabalho da Ahmadia em prol da comunidade, das mãos do presidente interino da Câmara, vereador Maurinho Branco (PP), que representou as autoridades municipais no evento. Em Petrópolis, a Ahmadia ajudou a equipar as escolas municipais Fábrica do Saber, na Estrada da Saudade; e Theófilo de Carvalho, em Secretário. O presidente interino da Câmara fez um discurso, durante o evento, que foi transmitido para diversos países, por meio da MTA – canal de televisão da Ahmadia.
Maurinho destacou, também, que ficou honrado em estar no evento.
- Foi uma emoção inexplicável estar fora do país e representar a nossa cidade. Vou levar isso para o resto da vida. Além do mais, o evento foi um encontro de paz. Fiquei impressionado com o silêncio e o respeito de todos na hora que o califa chegou. Viver a Jalsa Salana, com todas as tribos, todos os países, me marcou muito. Nos três dias, nós não vimos uma confusão, uma falta de respeito. Durante todo o tempo, as pessoas são agradáveis e ajudam. É uma experiência que eu vou levar para a vida – disse.
Petrópolis teve outro momento de destaque durante o Jalsa Salana UK: foi quando o califa homenageou estudantes que se formam com alto desempenho acadêmico. Entre eles, esteve Nadeem Ahmad, que se formou em Engenharia Nuclear pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
- Foi o meu maior presente, uma honra poder estar junto com o califa e poder receber algo das mãos dele. A premiação, com a medalha, foi um momento ímpar. As pessoas que estão aqui são muito afortunadas, e a nossa responsabilidade em não se acomodar e se superar, honrando a premiação como ela merece, aumenta - disse.
Sobre o evento, Nadeem lembrou que este é o momento de renovar a espiritualidade.
- Todos nós ficamos diante do califa, que é o sucessor do Messias prometido, e renovamos o nosso pacto de fidelidade, com as condições morais e espirituais que juramos honrar. Várias coisas passam pela cabeça, todas as nossas fraquezas, e essa reunião nos incentiva a renascer e cumprir de fato o compromisso de sermos novas pessoas - disse Ahmad, que participou pela terceira vez do Jalsa Salana UK.
Na comitiva brasileira, também estava presente o diretor-presidente do Grupo Tribuna de Petrópolis, Francisco de Orleans e Bragança. Integrante da família real, o príncipe entregou ao califa uma réplica da caneta usada pela Princesa Isabel para assinar a Lei Áurea, além de um prato do Museu Imperial.
- O evento foi muito bem organizado, e foi importante para abrir os olhos de nós, do Ocidente, sobre a Ahmadia e as religiões muçulmanas como um todo. Também podemos perceber que muçulmanos e católicos têm muitos laços em comum, católica em termo de Bíblia, Corão, culto. Achei muito interessante o fato que não haver, dentro da mesquita, a imagem de Maomé ou de Allah. Isso nos remete dizer que Allah está dentro de nós, e não em termos figurativos, como nós católicos vemos. Não quer dizer que está certo ou errado, é uma forma diferente de ver, introspectiva - disse.
O engenheiro eletricista Edson Mattos, que se converteu à Ahmadia em 2018, a religião, que prega a paz e o amor, é a esperança de dias mais tranquilos para o mundo.
- O que vimos aqui foi uma mensagem de paz para o mundo, com o propósito de harmonia, além da questão espiritual. A gente pôde ver a prática disso pelo tamanho do evento: mais de 35 mil pessoas circulando naquele espaço sem nenhum atrito, em total harmonia. Foi muito bem organizado, onde as pessoas estão com o espírito de receber, que é um dos princípios originais - afirmou.
Edson Mattos destacou que, no verdadeiro islã, a fé nunca é imposta: o muçulmano deve mostrar o benefício da religião através de ações e exemplos. O engenheiro considerou o evento uma experiência única.
Veja também: